15 minutos à Belenenses

Arrebatante a tradição — ou a vertigem — dos «quinze minutos à Belenenses», marcada, como em desafio à glória, por toques especiais de apitos e cornetins, entre os seus adeptos. No último quarto de hora viravam-se resultados, conquistava-se ouro, no ardor épico da galhardia de pensar que tudo era possível. E era. Foi assim no jogo que tudo decidia, contra o Sport Elvas e Benfica, na última jornada do Campeonato Nacional de Futebol da I Divisão.
Ao intervalo, os elvenses venciam por 1-0, resultado que servia ao Benfica, ainda a viver a euforia de uma vitória histórica sobre o Sporting, por 7-2! À passagem dos 75 minutos, o Belenenses empatou, por Quaresma, que despertava de madrugada e ainda noite feita apanhava o cacilheiro para poder estar nas Salésias à hora do treino, trabalhando, depois, como, afinal, todos os outros, o resto do dia, como electricista.
Cinco minutos depois, através de Rafael, o golo que valeu o título. E a festa toda de azul e oiro — de sangue, suor e lágrimas.Comovente, asseveram as crónicas, os homens da «cruz de Cristo», unidos num abraço longo, no centro do terreno, com as faces inundadas de suor, desfeitas também em lágrimas.
Rafael, que decidiu, nesse preciso momento, abandonar o futebol, «para poder sair em beleza — campeão», confidenciaria, depois, que nunca julgara possível chorar-se, assim, de alegria.
Para Capela, guarda-redes e estudante de Letras, o êxito ficara a dever-se às duas duras sessões de treino semanais, «uma de ginástica e outra de bola», que todos os jogadores «faziam com sempre renovado prazer na emoção das Salésias», antes ou depois de mais um dia de trabalho. Feliciano, a mais apaixonante das «torres de Belém», sentira o título, garantiu ele, como a recompensa de Deus por uma partida do destino: não muito tempo antes não pôde alinhar contra a Espanha, no Estádio Nacional, por ter «engordado dois quilos durante o estágio».
A mágoa andou consigo durante semanas e semanas. Mas, aquela «tarde mágica» de Elvas tudo apagou. E, talvez por isso, já depois de ter marcada viagem para o Rio de Janeiro, no Serpa Pinto, para aventura que o levaria para o Vasco da Gama, rasgou o bilhete e continuou nas Salésias, na ilusão de outras tardes, de outras glórias.
Seria em vão, mas... «Quando terminou o encontro de Elvas estávamos todos arrasados, completamente exaustos, mas mesmo assim ainda tivemos ânimo para chorar de felicidade, como Madalenas inconsoláveis. Tinham sido os mais emocionantes 15 minutos à Belenenses...»
Quase mil contos para o Belenenses ser campeão
Um título que custou ao Belenenses 957 317$29. As receitas não chegaram a 668 contos. O prejuízo cifrou-se, pois, em 282 428$37. Mas valeu a pena. O Benfica, que nesse ano gastara 915 270$25, dos quais 85 250$00 para pagar ao treinador e 425 883$00 para subsídios aos jogadores, fechou um ano com um prejuízo de apenas 81 428$35 porque as suas receitas foram de 833 787$90. Números semelhantes envolveu o futebol do Sporting.
In História de 50 anos do desporto português. Edição “A BOLA”

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