Por estes dias discute-se em Belém um peditório. Os sócios são chamados a contribuírem financeiramente para compensar os erros das direcções. A ideia surgiu numa assembleia na qual estiveram reunidos, além dos sócios, as individualidades que inscreveram os seus nomes nos piores momentos de sempre do clube. Na minha cabeça a coisa assumia contornos dignos de um sketch do Gato Fedorento. Podia estar de um lado o actual líder a afirmar “eu fui o pior de sempre neste clube” e do outro lado a oposição a argumentar “discordo, sôtor, olhe que nós também fomos bastante medíocres”.
Isto de quem está na gestão do clube pedir ajuda aos sócios, dando-lhes uma falsa noção de que fazem parte do processo de tomada de decisões, serve geralmente de bengala jeitosa para varrer para debaixo do tapete as responsabilidades.
E nós, sócios, vamos respondendo afirmativamente como quem salva o objecto amado de um prédio em chamas. Por incrível que possa parecer a quem está de fora, somos nós os mais racionais da história toda. Mesmo correndo o risco de ficarmos chamuscados.
Quem aparentemente não tem vergonha de colocar o nome do clube na praça pública é que não tem o seu papel muito bem definido nesta história. Nós, já percebemos, estamos aqui como pronto socorro. Eles, os que gerem, estão aqui não se sabe bem para quê.
E neste momento os sócios vão discutindo a forma de pagamento da dívida situando-se a questão já na esfera da inevitabilidade. É o inevitável que surge sempre neste país: inevitável a austeridade, inevitável o corte dos subsídios e aparentemente inevitável entregar o estádio a menos que a malta se junte e oriente uns trocos. Por estes dias dou por mim a cantarolar o “Hábito Faz o Monstro” dos Rádio Macau: “Amanhã, talvez depois, antes não. Prometo que hei-de pensar, amanhã. Talvez tenha um plano ou dois, ou talvez mais, mas para já deixa passar um dia ou dois, quem sabe mais. E por que não deixar o mundo para depois, porque amanhã, quando for, há-de ser um mal menor”.
O dia seguinte ao pagamento desta dívida será aparentemente um dia igual a tantos outros.
Não se debate a urgência na Mudança. E não me refiro a demissões. Não estou a falar do habitual entra-e-sai. Há muito que em Belém existe o péssimo hábito da recusa em aprender com os erros cometidos.
Então vai-se insistindo e repetindo o disparate. Poucos de nós temos dúvidas de aquilo que os sócios discutem hoje entre si, o situar das preocupações na forma como cada sócio pode entregar o seu dinheiro ao clube, anda muito perto do pior momento de sempre na vida do nosso emblema. E regresso à música para lembrar os Ornatos Violeta e o tema “Chaga”: “Quando eu cair eu espero ao menos que olhes para trás, diz que não te afastas de algo que é também teu”.
Se isto fosse sobre o Belenenses tenho alguma certeza de que os dirigentes, actuais e passados, iriam seguir o seu caminho enquanto olhavam a paisagem. Lá atrás estaremos nós, os sócios, a fazer respiração boca a boca e manobras de reanimação.
Gennaro, é o sócio nº 5.874
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